Especialistas alertam sobre erros de diagnóstico sobre TDAH e consequências
Banalização de transtornos e falta de informação dificultam tratamentos e são sinal de atenção para pais e educadores
De alguns anos para cá parece comum o diagnóstico de transtornos e um dos mais conhecidos é o TDAH, ou seja, o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. De acordo com a Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA), cerca de 2 milhões de pessoas sofrem com o transtorno no país, porém é preciso redobrar a atenção, já que pesquisadores do mundo todo alertam sobre a banalização da condição que leva a falsos diagnósticos positivos. Segundo Talitha Viola, pedagoga, psicopedagoga clínica e orientadora educacional é essencial que pais e educadores assumam a postura de cautela.
“O TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por padrões persistentes de desatenção, hiperatividade e impulsividade, que podem se manifestar de forma isolada ou forma combinada e podem afetar de forma significativa o desempenho escolar, emocional e social da criança. É fundamental lembrar que nem toda dificuldade de atenção ou comportamento agitado é sinônimo de TDAH. Crianças podem apresentar sintomas semelhantes em momentos específicos, como em fases de mudanças, ansiedade ou estresse. Também é comum que a falta de interesse em uma atividade ou dificuldade em lidar com certas tarefas possa ser interpretada, erroneamente, como sintomas de TDAH. Portanto, é necessário cautela e uma avaliação criteriosa para evitar diagnósticos equivocados”, enfatiza.
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O diagnóstico de TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade) é uma tarefa complexa que envolve a colaboração de uma equipe multidisciplinar, composta por uma psicopedagoga, uma neuropsicóloga e um médico neurologista ou psiquiatra. Essa abordagem integrada é essencial para garantir um diagnóstico preciso e um plano de intervenção eficaz. A psicopedagoga avalia as dificuldades de aprendizagem, habilidades escolares e o impacto do TDAH no desempenho acadêmico através de avaliações de leitura, escrita, raciocínio lógico, memória e atenção no contexto educacional. Nessa etapa o objetivo dos testes é compreender como o TDAH interfere no processo de aprendizagem e apontar estratégias pedagógicas para mitigar essas dificuldades. Já, a neuropsicóloga investiga as funções cognitivas gerais e específicas, como atenção, memória, controle inibitório e planejamento realizando testes padronizados para mensurar aspectos cognitivos e emocionais, traçando um perfil detalhado das capacidades e limitações do paciente.
Aqui, o enfoque está em identificar alterações no funcionamento cerebral e como elas impactam o comportamento e o desempenho global. Por fim, o médico Neurologista ou Psiquiatra é responsável por integrar as informações fornecidas pela psicopedagoga e neuropsicóloga com a história clínica do paciente, descartando outros fatores que possam simular ou contribuir para os sintomas de TDAH. “É preciso frisar que somente o médico está legalmente habilitado para fornecer o diagnóstico final e prescrever medicações, se necessário e que a importância da testagem realizada pela psicopedagoga e pela neuropsicóloga é crucial, pois fornece dados objetivos e específicos que complementam a avaliação médica”, ressalta Talitha.
Essas informações auxiliam na diferenciação entre TDAH e outras condições, como dificuldades emocionais ou transtornos de aprendizagem. Ainda, oferecem uma visão abrangente sobre as áreas que precisam de suporte, sejam elas educacionais ou comportamentais e contribuem para a elaboração de intervenções personalizadas, com estratégias que atendem às necessidades específicas do paciente.
Por que a abordagem multidisciplinar é essencial
O TDAH é uma condição multifacetada, que afeta diversas esferas da vida do indivíduo. Sem uma avaliação detalhada e multidimensional, há risco de diagnósticos imprecisos ou intervenções inadequadas. A colaboração entre os profissionais assegura uma compreensão completa da situação e promove um acompanhamento mais eficaz e humanizado. Para Mariangela Seixas, Neuropsicóloga especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental é essencial que pais e criança sejam acolhidos durante o processo de testagens, que dura em média dois meses e meio.
“Em um primeiro momento realizo uma entrevista com os pais para identificar as dificuldades e apontamentos sobre a criança. Durante esse momento são levantadas questões primordiais sobre a gestação e saúde, gerando uma gama de informações sobre o desenvolvimento pessoal, emocional e cognitivo do filho ou filha, além de histórico familiar, muito importante para o complemento da avaliação. Por fim, requisito o maior número de informações sobre o desenvolvimento pedagógico, com a família, a escola e a psicopedagoga, e na sequência, iniciamos as sessões de avaliação com a criança”.
Na avaliação neuropsicológica, através de testes reconhecidos nacionalmente, o profissional avalia a capacidade cognitiva da criança e mede sua resposta a estímulos diversos. “Tudo é analisado com muito critério e cuidado porque não oriento rotular as sugestões diagnósticas. É preciso ressaltar que quem fornece o diagnóstico final é o médico especialista que acaba trabalhando em parceria com o neuropsicólogo durante todo processo, geralmente. Sempre oriento aos pais que tenham um olhar analítico sobre o comportamento da criança e notem se determinadas posturas acontecem e se repetem sempre ou somente em casos específicos”, explica a especialista.
Ainda de acordo com a neuropsicóloga, o mais importante é que os pais tenham um olhar voltado para o perfil da criança, que entendam o laudo, a sugestão de diagnóstico e busquem ferramentas que visem a melhora do desenvolvimento como um todo. “É preciso montar um quebra-cabeças de acordo com as tabulações apresentadas nos testes e tranquilizar os pais de que não é uma receita de bolo pronta. Sempre reforço que os testes são uma parte do processo de avaliação, mas o olhar é ampliado e somado com história pessoal, antecedentes familiares, perfil emocional e ambiente social. Além do olhar e critérios clínicos multiprofissionais, quando necessário. Em consultório tenho casos em que algumas crianças apresentam dificuldades momentâneas, que tenham sido desenvolvidas por outro tipo de problema ou situação, e na avaliação mesmo notamos que não é algo cognitivo ou determinante para a vida toda”, explica a especialista.
Ao fim da apresentação do laudo da avaliação neuropsicológica acontece o encaminhamento ao médico para fechamento do diagnóstico e orientação sobre as próximas etapas. “Dependendo dos resultados, geralmente é orientado que se siga o acompanhamento de dois profissionais que seriam a psicopedagoga, no caso de dificuldades na escola, e a neuropsicóloga que deve seguir a linha da terapia cognitivo comportamental, que lida com as dificuldades de adaptação e socialização de maneira mais prática e rápida”, aponta Mariangela.
Talitha ressalta que os laudos da psicopedagoga e da neuropsicóloga são complementares para contribuir com o perfil cognitivo e de aprendizagem da criança. “O laudo da neuropsicóloga desenha para mim como aquela criança ou adolescente funciona e facilita a evolução do meu trabalho. Tenho exemplos funcionais em meus atendimentos e vibro com cada conquista. O cérebro de crianças com TDAH por exemplo, responde melhor a rotinas e previsibilidade, ou seja, a organização de horários e tarefas contribui para o desenvolvimento das funções executivas. Além disso, o uso de atividades que incentivam o autocontrole, como práticas de mindfulness e jogos que exigem atenção, tem sido estudado pela Neurociência e mostra efeitos positivos”.
Seja qual for o diagnóstico, mais precisamente nos casos de crianças e adolescentes com TDAH, o acompanhamento com uma psicopedagoga é imprescindível. “Atuamos na criação de estratégias personalizadas que ajudam a criança a gerenciar melhor a atenção, a organização e a impulsividade, promovendo o desenvolvimento das funções executivas. Além disso, trabalhamos em conjunto com a escola e a família, orientando sobre práticas e adaptações que podem facilitar a aprendizagem e o convívio social da criança. Esse acompanhamento contribui para a criação de um ambiente de suporte, onde a criança se sente compreendida e capaz de progredir, elevando sua autoestima e reduzindo o impacto do TDAH em sua vida escolar e pessoal”, finaliza.